2010-02-09

O caso do leite na Austrália!



Hoje vou falar sobre um "case" de marketing ocorrido na Austrália nos anos 90. O problema todo girava em torno da queda no consumo de leite naquele país. A principal razão para explicar este fenômeno era a idéia, amplamente difundida, de que leites e laticínios em geral eram produtos gordurosos, calóricos e responsáveis pelo aumento das taxas de colesterol

Apesar da campanha negativa que vinha sofrendo nos últimos dez anos, a imagem do leite ainda era bastante positiva entre os consumidores. Vejam as frases abaixo e o percentual de consumidores que concordaram com ela:



alimento da mãe natureza - 65%

puro e natural - 62%

confiável - 63%

essencial para crianças em fase de crescimento - 90%

saudável - 83%

é importante porque fornece cálcio - 82%



Algumas pesquisas indicavam que a queda era particularmente acentuada entre as crianças. Mesmo concordando que o alimento era essencial para uma dieta saudável, os pais não estavam insistindo com seus filhos para que eles tomassem sua dose diária de leite. Por quê? Por várias razões, mas três pareciam ser as mais importantes:

Pais: com todas as demandas do dia-a-dia, com tudo o que tinham que exigir de seus filhos, com a vida complexa do jeito que é hoje, os pais não queriam se desgastar controlando se seus filhos tomavam leite o não! O leite tinha deixado de ser uma prioridade!

Crianças: nunca tinha existido uma campanha de marketing para estimular as crianças a tomarem leite. Pelo menos, não do ponto de vista infantil. O marketing do leite era simplesmente enfatizar os benefícios que este alimento proporciona ara a saúde. Chato, muito chato! Vocês já viram campanhas de bebidas para crianças? São coloridas e divertidas! Se a idéia era que as crianças tomassem leite e que, eventualmente, pedissem para tomar leite, era preciso falar com elas também e não só com seus pais! As crianças precisavam de um motivo para tomar leite!

Bebidas alternativas: as gôndolas dos supermercados estavam lotadas de bebidas muito mais atraentes para as crianças do que o leite - sucos, vitaminas, águas com sabor, refrigerantes, energéticos, isotônicos e muito mais.

Depois de analisar todos estes fatores, foi determinado que a tarefa primordial era recuperar o ligar de honra que o leite sempre ocupara nos lares australianos! Mas como?

1) o leite precisa passar a ser o protagonista - não basta ser a bebida para ser adicionada aos cereais ou um mero ingrediente culinário;

2)criar um motivo emocional que estimule os pais a oferecerem leite para seus filhos com mais frequência;

3) reforçar a importância do leite como "o melhor cuidado que um pai pode oferecer a seu filho";

4) envolver as crianças e estimulá-las a tomar mais leite;

5) transformar o leite, que era visto como uma commodity sem graça, em uma proposta gostosa e cheia de apelos;

Como o desafio foi enfrentado? Primeiramente, a indústria do leite percebeu a tendência do mercado em oferecer cada vez mais bebidas e sucos infantis aditivados com vitaminas e nutrientes - tudo isso era adicionado artificialmente, claro, enquanto que o leite já vinha "direto da fonte" com tudo o que as crianças precisavam. O leite era uma "volta ao básico", era o alimento confiável e nutritivo.

Este era, definitivamente, um ângulo a ser explorado na comunicação para os pais, mas já era sabido que uma campanha direcionada às crianças era fundamental!

Assim, uma campanha publicitária para a TV foi desenvolvida com foco nos pequenos. Para garantir a atenção deles e a imediata identificação com a história, um cenário futurístico foi desenvolvido. Tentei achar o filme no You Tube, mas não consegui, então descrevo aqui seu roteiro:

A história acontece em algum lugar num futuro não tão distante, na hora do almoço.

Vemos uma menininha fazendo o download da lição de casa em seu notebook (atenção, este filme é da década de 90, quando isso ainda era considerado futurístico!). Logo depois a menina se dirige à sala de jantar. Vemos então a menina e sua mãe conversando enquanto a mãe prepara o almoço com a ajuda do "Reconstrutor Molecular". Neste filme toda a comida é "reconstruída" por um campo molecular vindo do tal aparelho - mesmo assim, a mãe e a menina tomam um copo de leite que não passou pelo "Reconstrutor Molecular".
Enquanto a filha espera que seu sanduíche seja "reconstruído", ela pergunta à mãe porque o leite não vem do "Reconstrutor Molecular". A mãe explica que o "Reconstrutor" não consegue reproduzir um leite tão bom quanto aquele que a natureza oferece - o aparelho não consegue melhorar uma bebida tão perfeita.

Acena termina com as duas brindando, batendo um copo no outro, no internacionalmente conhecido gesto de "tim-tim" e dão risada.

Aparece um letreiro com os dizeres: "Você não consegue melhorar o que já é perfeito".

Este filme, na opinião dos profissionais de marketing reunia tudo o que a indústria precisava: a informação nutricional do leite, a mensagem de que o leite é natural, sem necessidade de aditivos e um contexto chamativo para as crianças da época (visualmente impactante também): computadores, download de lição de casa, cenário futurístico e o "Reconstrutor Molecular". Além disso, os fabricantes de leite promoveram um concurso com a garotada em que o vencedor ganharia uma viagem, junto com sua família, para a NASA (beeem futurístico, né?).

O resultado? A campanha (que inclui também ações no ponto de venda)não só conseguiu reverter a tendência de queda no consumo observada nos últimos anos, mas também promoveu, já nos primeiros 6 meses, um crescimento de 1% no consumo da categoria.

É isso!
E amanhã tem mais...

4 comentários:

  1. Claudia,
    Lembra-se dos bichinhos da Parmalat? possuo a coleção deles em duplicata k k k!!!
    Tenho notado que a cada hora um alimento é a bola da vez,já foi o leite, o açúcar, a canola e vai por aí...tudo explicado cientificamente e evidentemente dentro dos desejos do mercado
    Só um lembrete, vc confundiu a data
    bj

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  2. Claudia,
    desconsidere o lembrete, dei uma viajada.
    Desculpas

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  3. Olívia,

    achei o seu comentário muito pertinente! Você está certa, de tempos em tempos surge um alimento "vilão" ou "herói": o ovo, a linhaça, o azeite (este já esteve nas duas categorias), o vinho...se a gente levar tudo a sério, morre louca! Bj e obrigada pela dica!

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  4. Eu notei logo no comeco quando cheguei aqui na australia como o povo aqui toma menos leite do que no brasil! Muita gente nao toma cafe da manha. E a noite, onde brasileiro normalmente toma um leite com bolacha como janta, jah que o almoco eh grande, australiano come direitinho. Ou seja, eles tem menos chance de toma leite. Eh bem estranho... mas quase todos os meus amigos aqui nao tomam leite todo dia. As vezes, nem uma vez por semana!

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